martes, diciembre 15, 2015

SANTA TERESA (Reina de Llión)

Para general conocimiento, publicamos el texto de la Conferencia sobre Santa Teresa, reina de León, con la que nos ilustró el Dr. D. Nelson Correia Borges, el pasado 17 de octubre, con motivo del 300 Aniversario de la traslación a los sepulcros de plata de las Santas Reinas, en el Monasterio de Lorvão (Portugal) El texto está, naturalmente, en portugués pero creemos que con un pequeño esfuerzo, se puede comprender bien.

Do casamento do rei D. Sancho I com a rainha D. Dulce de Aragão, realizado em finais de 1174, foi primogénita D. Teresa, nascida provavelmente em 1176, na cidade de Coimbra. Só em 1186 nasceria o primeiro filho varão deste fecundo matrimónio, o futuro D. Afonso II. Teresa foi assim cuidadosamente educada como presumível herdeira do trono, com especial predilecção e protecção de seu avô Afonso Henriques, que muito deve ter influenciado o seu temperamento. Foi sua aia D. Goda, senhora de piedosas virtudes que lhe comunicou uma vivência de grande fervor religioso, rapidamente assimilada por Teresa e logo patente numa religiosidade precoce e compaixão para com os pobres, faceta de um carácter, também voluntarioso, que a acompanharia ao longo de toda a vida. No dizer dos cronistas era uma menina dotada de formosura, “juízo e discrição superior à sua idade”, pelo que causava admiração. O lugar privilegiado, relativamente aos outros irmãos, que D. Sancho lhe confere no testamento de 1188, é revelador do carinho que também o rei nutria por esta filha primeira.
Com dez anos apenas Teresa sofre os primeiros reveses de uma vida que muitos outros lhe traria: a morte do avô D. Afonso Henriques e o nascimento do irmão Afonso que a vinha afastar do cargo para o qual o seu querido avô a tinha andado a preparar

Em 1190 o jovem rei leonês Afonso IX pretendeu-a para esposa e, apesar de alguma resistência de Teresa, que preferiria seguir vida religiosa ou manter-se casta, as conveniências e estratégias políticas dos dois reinos, que assim obtinham um aliado contra Castela, falaram mais alto e calaram mesmo a circunstância de ambos serem primos direitos. Este grau de parentesco (Afonso IX foi o primeiro neto varão de Afonso Henriques) era altamente reprovado pela Igreja nestes casos e, por isso, esta união envolvia alto risco. O casamento celebrou-se em Guimarães, em 15 de Fevereiro de 1191. Afonso teria cerca de 20 anos e Teresa perto de 16.

Assim se inicia uma nova fase na vida de D. Teresa. Herdeira da fecundidade de seus progenitores, não tardou a dar à luz o primeiro fruto desta união: uma menina, a quem a rainha deu o nome da sua irmã mais chegada e predileta, a infante Sancha. Logo se lhe seguiram o infante D. Fernando e a infante D. Dulce. Estes anos, que se anteveem felizes, não tardariam a ser perturbados pela pressão exercida por Castela junto da Santa Sé. O papa Celestino III declarou a nulidade do casamento em 1194, pondo fim à união dita incestuosa. Em 1195 já D. Teresa se encontrava em Portugal, trazendo consigo a infante D. Dulce, ainda pequenina, tendo deixado em Leão os dois filhos de tenra idade, D. Sancha e D. Fernando.

Nestes breves quatro anos na coroa leonesa, a rainha não pôs de parte o seu pendor pelas coisas da religião. Protegeu os cavaleiros da ordem de Calatrava, proporcionando-lhes meios para fundar uma casa e fortaleza em Nápoles. Em Leão pôde conhecer de perto o mosteiro de Gradefes, fundado em 1168 e situado a cerca de cinco léguas da capital do reino. Neste mosteiro se observavam os usos da novel ordem de Cister e por ela se apaixonou verdadeiramente Teresa. Mais tarde, por volta de 1228, voltando a Leão, D. Teresa empenhou-se em fundar aí uma nova comunidade cisterciense: o mosteiro de Villabuena del Bierzo, provavelmente adaptado ou construído a partir de um palácio da rainha. Villabuena del Bierzo, que actualmente é representado pelo mosteiro de San Miguel de las Dueñas, onde foi incorporado, no séc. XVI, converteu-se no principal refúgio de D. Teresa em terras de Leão e foi também o local a que suas filhas, Sancha e Dulce, se acolheram, depois de 1230.

O regresso de D. Teresa à corte de seu pai, reavivou-lhe o desejo de se retirar para um mosteiro, onde poderia viver, como protectora, com a sua corte própria, ocupada entre a administração das suas propriedades e o serviço de Deus. A morte da rainha D. Dulce, em Setembro de 1198, deixou-lhe o cuidado de, como mais velha, criar as irmãzinhas, mais novas que os seus próprios filhos, D. Branca, D. Berengária, provavelmente gémeas, e, porventura, D. Mafalda. Lorvão, poderoso e prestigiado mosteiro, vindo do antigo monaquismo peninsular, onde se albergavam monges sob a regra de S. Bento, afigurou-se à família real como o local ideal para pôr em prática este desiderato, pela sua proximidade com Coimbra. O bispo de Coimbra, D. Pedro Soares, de bom grado acolheu estas intenções e conduziu o processo.

Não foi fácil a cedência dos monges. O processo foi longo e de custosa resolução. Em 1205, na véspera de Natal, segundo os cronistas, D. Teresa deu entrada em Lorvão, acompanhada de monjas observantes dos usos de Cister. Porém, só em 1211 e depois de intervenções várias e de volumosa indemnização paga aos monges pela rainha, se completou o acto final de uma legalização que transformou o mosteiro de Lorvão de comunidade masculina em feminina. Pela acção de D. Teresa, Cister contava agora com a primeira casa feminina em Portugal e muitas outras se lhe iriam suceder.

Uma lenda se gerou sobre a escolha de Lorvão. Teresa tentou erguer a casa noutro local, mas tudo o que se construía num dia, de noite se desfazia inexplicavelmente. Teria sido então que Deus lhe proporcionou uma visão em que metaforicamente lhe era revelado que o local, entre serras, estava assinalado por um loureiro vão, aos pés do qual corria uma ribeira ao contrário (em Lorvão a ribeira corre para nascente).

D. Sancho I morreu em 1211, mas no seu último testamento, feito um ano antes, tinha distinguido D. Teresa com abundantes riquezas em metal sonante e importantes jurisdições territoriais, designadamente Montemor-o-Velho e Esgueira. O novo rei, D. Afonso II, logo exigiu de Teresa e das suas irmãs a jurisdição e a soberania sobre as propriedades doadas por seu pai, reservando-se também o direito de nomear os alcaides dos castelos. O conflito deflagrou, com recurso do rei à força armada. Em breve a questão ultrapassou a mera dimensão pessoal e familiar para se transformar em nacional e mesmo internacional. Toda a nobreza contestatária de Afonso II se reuniu em torno de D. Teresa, ao mesmo tempo que a sua ligação ao reino de Leão fez com que o seu ex-marido Afonso IX e seu filho D. Fernando viessem em seu auxílio, tomando Chaves e outras praças do norte do reino. De assinalar o contributo de Gonçalo Mendes de Sousa, membro de uma das mais poderosas famílias de Portugal, e do infante D. Pedro, seu irmão, que se encontrava na corte de Leão.

A contenda só viria a ser definitivamente encerrada, no reinado de D. Sancho II, em 1223. Tempos de grande perturbação e preocupação para D. Teresa que, em Agosto de 1214, se deslocou, com grande desgosto, a Santiago de Compostela para chorar o seu filho Fernando, precocemente falecido, e assistir às exéquias fúnebres pelo malogrado herdeiro do trono de Leão.

Nova preocupação se instala no espírito de D. Teresa: a sucessão no trono de Leão, por suas filhas D. Sancha e D. Dulce estava ensombrada pela existência de um filho do segundo casamento de Afonso IX com D. Berengária de Castela (igualmente anulado pelo mesmo motivo), também Fernando de seu nome, o III no trono de Castela. D. Berengária quer garantir a coroa leonesa ao seu próprio filho. Este contesta os direitos das meias-irmãs e os partidários de ambos os lados envolvem-se em guerra civil. D. Teresa sai em defesa das filhas, mas o problema acaba por ser resolvido pacificamente numa reunião havida em Valença do Minho, entre as duas ex-mulheres de Afonso IX. Teresa de Portugal teve aqui um papel inteligente e conciliador. Lavrou-se o tratado de Benavente, em Dezembro de 1230, pelo qual o reino ficaria a D. Fernando, consumando-se assim a união de Leão e Castela, mas as infantes receberiam como compensação algumas terras e vultuosa pensão.

Teresa estava finalmente livre para se dedicar ao seu mosteiro de Lorvão, à quietude da oração e às boas obras. Mas novas provações ainda lhe estavam reservadas: a morte de suas filhas, pela década de 1240, e o envolvimento, embora discreto, na contenda que opôs D. Sancho II a D. Afonso, seus sobrinhos, e que levaria à deposição de D. Sancho.

Apesar de a vida ter sido tão agitada para D. Teresa, o seu devotamento às coisas da religião foi uma constante em toda a sua existência terrena. Bem elucidativa é a carta que o papa Inocêncio III lhe dirige, em 17 de Janeiro de 1203, pedindo a sua protecção para o recém-nomeado bispo de Viseu, D. Nicolau. Inocêncio III afirma: “sabemos por experiência ser tal o fervor da afeição sincera que mostrais às igrejas e varões eclesiásticos, que se vos julgam conhecidas vantagens entre as mais pessoas poderosas, no cuidado e vigilância com que procurais suas conveniências”. Pede-lhe, por isso, que ajude o novo bispo viseense “com favor e conselho nas causas próprias, ou nas de sua igreja”.

A albergaria de Poiares, fundada por sua mãe e por si própria teve sempre o seu especial desvelo e atenção.

A preferência de D. Teresa foi, principalmente, para o clero regular, sendo as novas ordens as que mais lhe mereceram protecção. Para os dominicanos se estabelecerem em Coimbra com seu convento, adquiriu vários terrenos no sítio da Figueira Velha, junto ao rio Mondego, tendo feito a doação em 1227. Em 1242 e a pedido dos frades mandou lavrar uma carta de confirmação, onde enumera os terrenos doados, os antigos proprietários e as circunstâncias das compras. Para os franciscanos adquiriu uma herdade no lugar de Caldas, junto a Montemor-o-Velho, em Junho de 1221. Transformou-a num horto e fez aí construir casas e uma igreja em honra de S. Nicolau, que entregou à ordem dos Frades Menores, para se instalarem. Os frades, algum tempo depois, desinteressaram-se do local e abandonaram-no. A rainha, porém, considerando a sua sacralidade, não quis ficar com ele e doou-o, em 1223, ao mosteiro de S. Paulo de Almaziva, cisterciense, ainda nos primórdios da sua existência. A sua simpatia e veneração pelos franciscanos está também patente no desejo de possuir algumas relíquias dos Mártires de Marrocos. Logo que soube da sua chegada a Coimbra, enviadas pelo infante D. Pedro, seu irmão, obteve para o mosteiro de Lorvão os ossos de um dos mártires, bem como “um baraço com que trouxeram os mártires arrastrados em Marrocos por todas as ruas e praças da cidade”. Foram sempre objecto de grande veneração das monjas laurbanenses, em todos os tempos.

Igualmente as enceladas de além da ponte, em Coimbra, mulheres que viviam asceticamente, isoladas e encerradas entre quatro paredes, consagradas à penitência e oração, não sujeitas a qualquer regra e subsistindo graças à caridade pública, foram objecto dos seus cuidados de protecção e auxílio.

Também Teresa se sentia fascinada pela vida de oração e penitência. Ficaram memórias das longas horas de prece e meditação de joelhos, perante um crucifixo, de jejuns, das austeras práticas das sextas-feiras, do seu cuidado e desvelo para com pobres, doentes e peregrinos.

Relatam alguns autores que Santo António fez um milagre, a instâncias de D. Teresa, na pessoa de sua irmã D. Branca, que tratou desveladamente como filha e herdeira.

Um breve do papa Gregório IX, de 1231 refere que D. Teresa recebeu o hábito de Cister, mas o texto não é suficientemente transparente para perceber se a tomada de hábito se fez em Villabuena, se em Lorvão, uma vez que a referência é feita no passado. A vida um tanto agitada de D. Teresa, repartida por Lorvão e outros locais, pouco ou nada sujeita ao rigor da clausura, parece indicar que nunca teria feito votos, ou, pelo menos, votos totais. Quando o seu túmulo se abriu, em 1617, o seu corpo incorrupto estava amortalhado no hábito de S. Bernardo. Provavelmente vestiu as roupas cistercienses por pura devoção, tal como seu sobrinho D. Sancho II tomaria o capelo de agostinho ou terceiro franciscano.

Em 17 de Junho de 1250 a sua jornada de uma vida rica de acontecimentos e emoções chegou ao fim. Esta mulher, que foi a mais poderosa de Portugal, na primeira metade do século XIII, ficou sepultada num austero túmulo de pedra, sem ornatos nem distintivos, que havia mandado preparar para si. D. Teresa continuaria a ser sempre para Lorvão a sua grande protectora e figura carismática: rainha e reformadora material e espiritual do mosteiro, reuniu em si a mais alta dignidade deste mundo e o papel de mediadora junto do sagrado. Não admira que desde muito cedo tivesse sido envolvida numa aura de santidade, juntamente com Sancha, sua irmã. Em breve a sua veneração ultrapassou os muros do mosteiro fazendo acorrer peregrinos que vinham implorar graças junto das sepulturas daquelas que rapidamente se designaram por Santas Rainhas. Com este epíteto serão qualificadas pelos tempos fora e consagradas no breve do papa Clemente XI que as beatificou.

Dada a afluência de fiéis, as primeiras diligências para a beatificação iniciaram-se em 1574, mas só em 1634 se deu início ao processo canónico que foi necessário encetar de novo em 1667. Recolheram-se depoimentos de 120 testemunhas. Finalmente, em 13 de Setembro de 1704, foi alcançada a beatificação Vivæ vocis oraculo. O correspondente breve de Clemente XI, Solicitudo Pastoralis officii, foi passado em 23 de Dezembro de 1705. Fixou-se o dia da sua festa a 17 de Junho. Foram também concedidas outras prerrogativas litúrgicas bem como a extensão do culto a todo o Portugal, seus domínios e senhorios, o que, somado ao culto prestado em toda a ordem de Cister, fez com que Santa Teresa ficasse com estatuto semelhante ao de canonizada. Presentemente, o calendário litúrgico celebra Santa Teresa, juntamente com suas irmãs, Santa Sancha e Santa Mafalda a 20 de Junho, data que nada significa para qualquer delas.

Desde 1630, e sobretudo desde 1661, que Santa Teresa se encontra representada nesta qualidade no mosteiro de Lorvão. Nas suas imagens se assentou a iconografia que se tornou habitual: enverga o hábito de Cister; tem aos pés uma coroa real, símbolo das honrarias do mundo desprezadas; numa das mãos segura um crucifixo, alusivo às suas orações, e na outra um livro, da sua qualidade de reformadora. Numa imagem de San Miguel de las Dueñas segura sobre o livro uma fachada de igreja, como fundadora de Villabuena del Bierzo. Outras representações, como em Lorvão e Cós, ilustram milagres que lhe são atribuídos. Surge também representada com sua irmã Santa Sancha na pintura de Giovanni Odazzi, em Santo António dos Portugueses, em Roma, da qual se fez uma gravura que está na origem de outras versões pictóricas existentes em várias igrejas portuguesas.


BIBLIOGRAFIA:
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